Melo Cabral Cardoso / Trigueiros
É sabido que os Trigueiros tiveram um dos seus primeiros núcleos de dispersão territorial a partir da região de Lisboa e de Torres Vedras em meados do século XVI. Daqui passaram a outras terras, no Alentejo (Vila do Cano) e nas Beiras (Coimbra e Idanha-a-Nova). Alguns deles foram em busca de uma formação letrada na Universidade de Coimbra, cidade onde acabaram por realizar consórcios matrimoniais que os levaram a expandir-se por outras regiões.
Um destes ramos, dos Trigueiros de Coimbra/Idanha-a-Nova, esteve na origem de um pequeno núcleo familiar que se fixou no antigo concelho de São João das Areias (concelho extinto em 1895), onde se ligou à popularmente chamada Casa das Armas Reais, assim como à Casa dos Neves de Lemos da Póvoa de Mosqueiros, duas emblemáticas casas solarengas desta região do interior beirão – cuja memória, quase perdida, aqui vamos recuperar do esquecimento.
Pedra de Armas
Brasão de: António de Melo Cabral
Cardoso da Silveira (1731-1821)
Forma: Escudo esquartelado: o 1.º de CABRAL (Espanhol) – com duas cabras afrontadas (devia ser, de
prata, com duas cabras de negro, gotadas de ouro, uma sobre a outra); o 2.º de
SILVEIRA – um ramo de silvas, que aqui
serão armas falantes[1], sobre 3 faixas (devia ser, em campo de prata, com
três faixas de vermelho); o 3.º de CARDOSO – em campo
vermelho, com um cardo de verde, florido de duas peças de prata, com raízes e
perfis de oiro, entre dois leões de oiro batalhantes; e o 4.º de MELO – em
campo vermelho seis besantes de prata entre uma cruz dobre e bordadura de ouro.
Elmo: De grades, de perfil, encimado por um
coronel de nobreza.
Local: Cunhal da Casa das Armas Reais.
Data: Século XVIII (2.ª metade)
S. J. de Areias, Casa das Armas Reais (Séc. XVIII, 2.ª metade) |
O seu destinatário, cuja Carta de
Brasão de Armas é desconhecida, foi ANTÓNIO DE MELO CABRAL CARDOSO DA SILVEIRA
(n. 1731) que deixou alguns vestígios documentais nos registos paroquiais desta
freguesia, com prováveis ligações a Idanha-a-Nova, pois foi casado com D.
ÚRSULA MARIA RITA TRIGUEIROS DA COSTA LEMOS (n. 1753), cuja família era
originária desta última cidade.
O detentor da
pedra de armas
da Casa das Armas Reais
da Casa das Armas Reais
ANTÓNIO DE MELO CABRAL CARDOSO DA
SILVEIRA (1731-1821), senhor da Casa das
Arnas Reais, foi baptizado a 10-VIII-1731 em São João das Areias, apadrinhado por Martinho Carriço e D.
Isabel de Melo Cabral, tendo aí falecido a 22-XII-1821.
S. J. de Areias, Pelourinho. |
Neto paterno de D. António de Eça, natural de Gonçalo, bispado da Guarda, e de sua mulher D. Joana; e materno de Sebastião Ribeiro de Brito[3], e de D. Ana das Neves Rozeuma, ambos naturais de São João de Areis[4].
Era irmão de D. Feliciana, casada a
5-XI-1741 em São João de Areias com Feliciano José de Melo Pais do Amaral (n.
1695), do qual não teve geração.
Residiu
na chamada Casa das Armas Reais, cuja
edificação lhe é atribuída e terá sido feita por volta 1780-90 pelo mestre
pedreiro João de Fontes[7]. Este elegante
solar barroco, do último quartel do século XVIII, está armoriado com um escudo
esquartelado de 1.º - CABRAIS, 2.º - SILVEIRAS, 3.º - CARDOSOS, e 4.º - MELOS; com um elmo de perfil, encimado por um coronel de nobreza.
S. J. de Areias, Casa das Armas Reais. |
Sua mulher, D. Úrsula Maria, era filha de Caetano Neves de Lemos
(c. 1750), morgado da Póvoa de Mosqueiros onde tinha a Casa dos Neves de Lemos com capela anexa, licenciado em Cânones
pela Universidade de Coimbra, natural de São Miguel de São João de Areias, casado
a 17-IX-1750 na Igreja de São João de Santa Cruz de Coimbra com D. Brites
Teresa Trigueiros da Costa (n. 1725), baptizada a 10-V-1725 na
freguesia de Eiras, em Coimbra, tendo por padrinhos Caetano Calisto Cabral e D.
Brites religiosa no Convento de Santa Ana em Coimbra; neta paterna de Domingos
Neves, natural de São Miguel, e de sua mulher D. Maria Gomes, natural da Póvoa de
Mosqueiros; e neta materna de Jorge Trigueiros da Costa (n. 1698), homónimo de
seu pai, que no baptismo era ANDRÉ tendo mudado no Crisma para JORGE,
baptizado a 31-XI-1698 “em necessidade” pelo padre Pedro Geraldes
Leitão, que sucedeu num morgado nos subúrbios da cidade de Coimbra onde se
fixou em Agosto de 1723, e foi senhor da Quinta
da Ribeira de Coselhas na freguesia de Santa Cruz em Coimbra onde residia
em 1750[8],
tendo casado a 18-IX-1723 na freguesia de Eiras, em Coimbra, com D. Úrsula Marques
(n. 1683), baptizada a
11-II-1683 na freguesia de Eiras, concelho de Coimbra, apadrinhada por António
Marques Cardoso e Úrsula Baptista.
Póvoa de Mosqueiros, Casa dos Neves de Lemos. |
As
ligações desta família de Idanha-a-Nova a Coimbra já eram antigas, pois, Sebastião
Aleixo Trigueiros – o pai de Jorge Trigueiros da Costa (1665?-1704) – consta
que era natural de Idanha-a-Nova, ou de Coimbra onde residiu na rua das Solas
(hoje rua Adelino Veiga), freguesia de Santiago, e foi escudeiro e «homem
nobre com criados e cavalos», assim como «procurador do número de
Idanha-a-Nova» no reinado de Filipe I (1580-1598)[12],
tendo casado com D. Luísa Guterres, filha de Jorge Gonçalves Guterres, «advogado
que foi nesta cidade de Coimbra», e de sua mulher Isabel Antónia da
Maia, todos eles naturais de Coimbra.
♦
ANTÓNIO DE MELO CABRAL CARDOSO DA
SILVEIRA (n. 1731), e sua mulher D. ÚRSULA MARIA RITA TRIGUEIROS DA COSTA LEMOS
(n. 1753), senhores da Casa das Armas
Reais, não tiveram geração do seu matrimónio pelo que a citada casa terá
passado a parentes colaterais do marido, os quais desconhecemos quais foram.
D. ÚRSULA MARIA RITA TRIGUEIROS DA
COSTA LEMOS (n. 1753) teve um irmão em cuja sucessão poderia ter recaído a posse da chamada Casa dos Neves de Lemos na Póvoa de Mosqueiros:
Assinatura de Domingos N. Lemos. |
1. DOMINGOS NEVES DE LEMOS TRIGUEIROS DA
COSTA (b. 1751), baptizado a 21-X-1751 na freguesia de São Miguel, São João de
Areias, concelho de Santa Comba Dão, filho do Dr. Caetano Neves de Lemos, morgado, e de D.
Brites Teresa Trigueiros da Costa (n. 1725).
A 22-VI-1771,
aos 20 anos de idade, tirou o bacharelato em Cânones na Universidade de Coimbra,
e a formatura um mês depois, tendo sido juiz Ordinário e das Sisas (1777, 1799,
e 1817).
Póvoa dos Mosqueiros, Casa dos Neves de Lemos / Trigueiros. |
Herdou em Póvoa de
Mosqueiros, São João das Areias, a casa solarenga e a quinta que foi dos seus
parentes Neves de Lemos, para onde foi residir em 1804[13].
Casou a 6-VI-1818 em
Mouraz, concelho de Tondela, com D. ÚRSULA MARIA DE JESUS, também natural de
São João de Areias, filha de Bernardo Pedrosa e de D. Caetana Maria.
Tiveram:
2. FRANCISCO
DE LEMOS TRIGUEIROS DA COSTA, que segue.
2. FRANCISCO DE LEMOS TRIGUEIROS DA COSTA, natural
de São Miguel de São João de Areias.
Casou com D. ANA DELFINA DA COSTA, natural
de Mourão.
Tiveram:
3. JOSÉ ALEXANDRINO DE LEMOS TRIGUEIROS DA COSTA
E BRITO, que segue abaixo.
3. JORGE ALEXANDRINO DE LEMOS TRIGUEIROS DA
COSTA E BRITO. S.m.n.
3. JOSÉ ALEXANDRINO DE LEMOS TRIGUEIROS DA COSTA E BRITO (c. 1847), natural
da Póvoa de Mosqueiros, freguesia de São João de Areias.
Em 1847 pertencia ao
Batalhão Provisório de Voluntários Nacionais Cartistas do Carregal do Sal e em
1848 estava no Batalhão Nacional de São João de Areias. Foi nomeado administrador do Concelho de São João das Areias (Carta de 13-III-1861).
Casou
com D. JACINTA LUCINDA, natural de Tibalde, freguesia de Fornos de Maceira Dão,
concelho de Mangualde.
Filhos:
4.
ANTÓNIO DE LEMOS TRIGUEIROS, que
segue abaixo.
4. MARIA DE LEMOS TRIGUEIROS.
4. BEATRIZ DE LEMOS TRIGUEIROS.
4. NICOLAU DE LEMOS TRIGUEIROS.
4. ANTÓNIO DE LEMOS TRIGUEIROS que foi vereador
da Câmara Municipal de Tondela, casado com D. CASIMIRA AUGUSTA PEREIRA DO VALE.
Filha:
5. D. MARIA AUGUSTA DO VALE E LEMOS
TRIGUEIROS, que segue.
5. D. MARIA AUGUSTA DO VALE E LEMOS
TRIGUEIROS, nascida em Vila Nova da Rainha, concelho de Tondela. Casou com
DELFIM RODRIGUES LOBO, filho de Francisco Rodrigues Lobo (f. 1925).
Filho:
6. ANTÓNIO
DE LEMOS TRIGUEIROS DO VALE E LOBO (n. 1910), que segue.
6. ANTÓNIO DE LEMOS TRIGUEIROS DO VALE E LOBO (n. 1910), nascido a 29-X-1910 em Vila Nova da
Rainha, no concelho de Tondela.
Casou em 1935 no Sobral, concelho de Carregal do Sal, com D. EMÍLIA AUGUSTA DE MIRANDA
MONTEIRO.
Tiveram:
7. DELFIM MONTEIRO TRIGUEIROS LOBO (n.
1936), nascido a 16-X-1936 na Sé Nova, em Coimbra.
7. AMADEU MONTEIRO TRIGUEIROS LOBO (n.
1941), nascido a 30-III-1941 em Sobral, Carregal do
Sal. Casou com D. MARIA
CLÉLIA MOREIRA DE CARVALHO ALMEIDA.
Filhos:
8. HELENA SOFIA DE CARVALHO ALMEIDA
TRIGUEIROS LOBO (n. 1967), nascida a 2-I-1967
em Avelãs de Caminho, Anadia.
em Avelãs de Caminho, Anadia.
8. LUÍS CARLOS DE CARVALHO ALMEIDA TRIGUEIROS
LOBO (n. 1968), nascido a 6-IX-1968
em Avelãs de Caminho, Anadia.
em Avelãs de Caminho, Anadia.
8. ANTÓNIO MIGUEL DE CARVALHO ALMEIDA
TRIGUEIROS LOBO (n. 1977), o qual nasceu
a 15-III-1977 em Avelãs de Caminho, Anadia.
a 15-III-1977 em Avelãs de Caminho, Anadia.
7. ANTÓNIO MARIA MONTEIRO TRIGUEIROS LOBO
(n. 1943), nascido a 19-VI-1943.
7. ACÁCIO MONTEIRO TRIGUEIROS LOBO (n.
1948), nascido a 20-VII-1948 em Sobral, Carregal do
Sal.
Sal.
Casou com D. MARIA TERESA DE PINA CUNHA (n. 1955), natural
da freguesia de Santa Maria da
Devesa, Castelo de Vide, filha de João Abel da Pina Cunha e de D. Maria Berta Martins de Pina.
Devesa, Castelo de Vide, filha de João Abel da Pina Cunha e de D. Maria Berta Martins de Pina.
Filha:
* Fotos extraidas do Blogue «SOLARES E BRASÕES»,
de Manuel Ferros
[2]
No assento de casamento não consta
o apelido materno Rozeuma.
[3] SEBASTIÃO RIBEIRO DE BRITO era filho de Valério Ribeiro das Neves (b. 1603), capitão-mor
(1669), baptizado a 15-IV-1603 em S. J. de Areias, casado com D. Feliciana de
Brito (f. 1687), falecida a 31-I-1687 “mulher do capitão-mor está enterrada na Capela de Valeriano Ribeiro seu
filho”; neto paterno de Valeriano
Ribeiro Rozeuma de Brito, (b. 1656), capitão-mor, baptizado a 15-IV-1656,
casado a 7-X-1678 em Vila Deanteira com D. Isabel Maria de Almeida (c. 1660).
[4] Dados colhidos do assento de casamento de Francisco da
Silveira de Eça com D. Feliciana Maria de Brito.
[5] São João de Areias tinha nos finais
do século XVII uma capitania-mor constituída
por duas companhias de ordenanças, sob o comando de um capitão-mor, coadjuvado
por um sargento-mor.
[6] Os eleitos eram “homens bons e
principais do povo.”, figuras de maior prestígio e seriedade da freguesia (Neves, António N. da C., “Igreja Matriz …”. p.
[7] JOÃO
DE FONTES residiu na Póvoa de Mosqueiros (1769), onde terá construído a Casa dos Neves de Lemos, tendo passado
posteriormente a morar na Vila de Óvoa (1780), concelho de Santa Comba Dão. Este
foi o construtor da actual capela São Silvestre da Vila Deanteira (Séc. XVIII),
em substituição do templo antigo que se encontrava completamente arruinado. O
início desta sua última obra data de 1791, e terá sido iniciada após a
conclusão da “Casa das Armas Reais”.
[8] Manuel
Álvares Piteiros (n.1700), de
Idanha-a-Nova, declarou num processo de justificação de nobreza «que Jorge Trigueiros Irmão da Avó do
Justificante he pessoa bem conhecida delle Depoente fora susseder em hum grande
morgado nos soburbios da cidade de Coímbra» (sic). – in ANTT, Cartório da
Nobreza, Processo de Justificação de Nobreza
de Joaquim Rebello Trigueiros Martel Leite (Autos de 1786), Mç. 22, Doc.
15.
[9] ANTT,
TSO, Mç. 2, Diligência 55, Inquisição de Coimbra, Carta de Familiar de
20-XI-1699; e ANTT, Cartório da Nobreza, Processo de Justificação de Nobreza de
Joaquim Rebelo Trigueiros Martel Leite (Autos), Mç. 22, Doc. 15.
[10]
O exército de Filipe V composto de
26.000 homens invade a zona de Idanha-a-Nova em Maio de 1704, ocupando,
arrasando, incendiando e pilhando inúmeras povoações, nas quais faz grande
número de mortos e prisioneiros. Por esta altura os exércitos invasores de
Filipe V apoderaram-se de Salvaterra do Extremo, Segura, Monsanto e Castelo
Branco. Estas operações militares provocaram uma total destabilização da região
que durou até meados de 1705, prolongando a crise económica devido às más
colheitas que se sucederam, até ao grande Inverno europeu de 1709-1710.
[11] No
distrito de Castelo Branco havia uma família de apelido Calvo, nomeadamente em
Monsanto, que foi aparentada em Idanha-a-Nova com os morgados dos Geraldes. Desta
conhecemos Fernão de Andrade Calvo (c. 1589) que em testamento de 1589,
Instituiu um morgadio em Monsanto, assim como um Gonçalo Gonçalves Calvo, c.c.
D. Catarina Geraldes, da qual teve geração que seguiu os apelidos VAZ NUNES,
VAZ PRETO, e VAZ DE CARVALHO – Cf. Luís Bivar Guerra, A Casa da Graciosa,
pp. 200-205. Conhecemos ainda o juiz João Nunes Calvo (c. 1622), e o tabelião
de Monsanto António Calvo De Andrade (1640), mas desconhecemos qual o
parentesco destes com a biografada. – in ANTT, Feitos Findos, Administração de
Casas, «Sentença passada por João Nunes Calvo ...» Mç. 96 n.º 43 cx. 97.
[12]
ANTT, Chancelaria de Filipe I, Liv.
10, f. 31v. — O procurador do número
era um dos oficiais da vila, de nomeação régia e regra geral com origem nobre,
espécie de promotor de justiça encarregado de representar a colectividade em
tribunal e responsável pelo alistamento militar.
[13] NEVES, António Nunes da Costa, Igreja Matriz e Capelas da Freguesia de S.
João de Areias – Santa Comba Dão, (Coimbra, GAAC, 2002), pp. 16,17.
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