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2010-04-24

Manuel Falcão Tavares (c. 1633), Alcaide - Fundão


Alcaide, Fundão.


Manuel Falcão Tavares (c. 1633)
                        

                           Brasão de:   Manuel Falcão Tavares (c. 1633)
                           Forma:          Escudo partido: o 1.º de TAVARES – de ouro, com cinco estrelas
                                                 de seis raios de vermelho; o 2.º de FALCÃO – de azul, com três
                                                 bordões de prata, ferrados de vermelho, postos em pala e alinhados
                                                 em faixa.
                           Diferença:    Um trifólio verde.
                           Local:           Conhecido documentalmente.
                           Data:             25-Jan.-1633



MANUEL TAVARES FALCÃOteve brasão de armas com escudo partido em pala, de TAVARES e FALCÃO,
tendo por Diferença um trifólio verde.
Este brasão foi concedido a 25-Jan.-1633, registado no Cartório da Nobreza (L. I, fl. 407v.), e apenas é conhecido documentalmente[1], ignorando-se a existência de qualquer pedra de armas que lhe corresponda.


Dados genealógicos:

1.  MANUEL TAVARES FALCÃO, foi tabelião do Público, Judicial e Notas da Atalaia, e morador no Alcaide,
    concelho do Fundão.
    A 18-III-1662 obteve autorização para renunciar o ofício de Tabelião a favor de seu genro Simão dos Reis
    Colaço (c. 1665)[2], o que parece ter vindo a acontecer em 1665.
    Era filho de Gaspar Tavares Falcão e de …(?) Antunes, e bisneto de Manuel Tavares, o qual foi capitão do
    Alcaide no tempo de El-Rei D. Sebastião.
    Casou com D. MARIA LEITOA DE AGUIAR PISSARRO.
    Filho:
    2.  ANTÓNIO FÉLIX FALCÃO TAVARES, que segue.

2.  ANTÓNIO FÉLIX FALCÃO TAVARES, natural de Alcongosta, residente no Fundão, casado com D. MARIA
    ROSA RIBEIRO, do Castelejo.
    Filha:
    3.  MARIA BÁRBARA FALCÃO DE AGUIAR LEITOA (f. 1833), que segue.

3.  MARIA BÁRBARA FALCÃO DE AGUIAR LEITOA (f. 1833), falecida a 11-X-1833.
    Casou por procuração a 5-VIII-1774 na Fatela, concelho do Fundão, com LOURENÇO JOSÉ TABORDA
    D’ELVAS DE NEGREIROS FEIO (1754-1829), nascido a 3-V-1754 no lugar de Chãos, na freguesia das Donas,
    concelho do Fundão, que faleceu a 16-IX-1829 e foi sepultado na sua capela da Fatela.  Este era Fidalgo
    Cavaleiro (3-IX-1824)[3], residente no Fundão onde foi vereador (1783-1829), sargento-mor capitão-mor
    (1804-1829); filho de Veríssimo Inácio Taborda d’Elvas de Negreiros (1715-1798) que nasceu a 21-I-1705 no
    lugar de Chãos, freguesia das Donas, e falecido a 16-IX-1798, tabelião, formado em Cânones pela Universi-
    dade de Coimbra, e de sua mulher Antónia Maria Feio (f. 1754), natural do Teixoso.
    Seu marido era senhor do solar «Taborda d’Elvas Falcão» (ou Falcão Tavares), onde está instalado o actual
    Museu Arqueológico José Monteiro (Rua do Serrão, Fundão), e da Casa Grande na Fatela, ambas com as
    suas fachadas armoriadas.    
    Tiveram 11 filhos, dos quais 4 ficaram conhecidos:
    4.  LOURENÇO JOSÉ TABORDA TAVARES D’ELVAS NEGREIROS FEIO FALCÃO (1788-1818), filho primogé-
        nito e homónimo de seu pai, bisneto do armigerado, nasceu a 10- VII-1781 na Fatela, tendo aí falecido
        prematuramente a 15-I-1818. Formado em Leis (27-VI-1803) e em Cânones (1808) pela Universidade de
        Coimbra.
        Por iniciativa do seu pai, quando ainda era menor de 5 anos de idade, obteve um brasão de armas com o
        escudo esquartelado de TABORDA, FEIJÓ (por erro de concessão, em vez de FEIO que lhe competia),
        FALCÃO TAVARES (brasão passado a 21-I-1788)[4].


Fundão, Solar Taborda d'Elvas Falcão
 (Museu José Monteiro)


Pedra de Armas do solar:
1.º - TABORDA, 2.º - FEIJÓ, 3.º - FALCÃO,

  4.º - TAVARES;
de Lourenço José Taborda Tavares d'Elvas
 Negreiros Feio Falcão (1788-1818)

























    4.  JOÃO ANTÓNIO TABORDA FALCÃO TABORDA (n. 1789), nascido a 20-XII-1789 na Fatela. Formado em
        Cânones (1813) na Universidade de Coimbra, foi vereador do Fundão (1828, 1832 e seguintes), assim
        como seu capitão-mor, em cujo cargo sucedeu a seu pai.
        Teve foro de fidalgo a 2-VII-1825, juntamente com seus irmãos João e Joaquim, devido aos serviços que
        foram prestados por seu pai.
    4.  JOSÉ MARIA TABORDA FALCÃO TAVARES (n. 1792) que nasceu em 1792, tendo-se formado em Cânones
        (1820) pela Universidade de Coimbra. Teve foro de fidalgo a 2-VII-1825.
    4.  JOAQUIM MARIA TABORDA FALCÃO TAVARES (n. 1799), nasceu a 15-IX-1799, tendo-se formado em
        Leis (1820) doutorado (1822) pela Universidade de Coimbra. Teve foro de fidalgo a 2-VII-1825.
        A capela de Nossa Senhora da Conceição, anexa à Grande Casa da Fatela, cuja edificação terá ficado a
        dever-se á iniciativa de seu pai em cumprimento de um voto relacionado com as Invasões Francesas, foi
        por ele remodelada num belíssimo estilo barroco, acrescentando-lhe a sua pedra de armas, assim como a
        data das novas obras (1858).


Fatela, Casa Grande / Taborda Falcão.

Fatela, Casa Taborda Falcão,
 pedra de armas.
Fatela, 
Capela da Casa Grande.



 
TAVARES – São uma das mais antigas linhagens portuguesas com origem no lugar de Tavares na Beira Alta. Têm a mesma ascendência dos Coutinhos, dos Fonsecas e dos Macedos, apenas diferindo as suas armas pelas cores e pelo número de raios das estrelas representadas.
FALCÃO – Pretendem alguns genealogistas que esta família procede do capitão inglês João Falconet que passou a Portugal com D. Filipa de Lencastre, mulher do rei D. João I, o que não invalida a existência de outros com o mesmo apelido com origem em alcunha.

  ________

Notas:

[1]   MACHADO, José de Sousa, Brasões inédito, Braga, A Folha do Minho, 1906, p. 128.
[2]   IAN/TT, Registo Geral de Mercês, D. Afonso VI, liv. 2, fl. 230v.
[3]   IAN/TT, Cartório da Nobreza, Registo Geral de Mercês, D. João VI, l. 19, fl 135v.
[4]   SANCHES DE BAENA, Visconde, Archivo heraldico-genealogico, 1.ª ed., Lisboa, Typographia Universal, 1872, p. 440.

2010-04-09

Casa Nogueira de Andrade (Séc. XVIII?) - Fundão

Paulo Nogueira de Andrade (c. 1688)?
Casa Nogueira de Andrade.
Fundão, Largo da Igreja
                      


                        Brasão de:   Paulo Nogueira de Andrade (c. 1688). 
                        Forma:         Escudo esquartelado (mal representado): O 1.º de FEIO – três bandas;
                                             o 2.º de COSTA – seis costas, postas 2, 2 e 2; o 3.º de ANDRADE 
                                             (dos Andrade Freire) - uma banda e duas cabeças de serpente; e o
                                             4.º de HOMEM – seis crescentes postos 2, 2 e 2.
                        Timbre:        Um ramo de feijoeiro florido, que é usado pelos Feios.
                        Local:           Fachada de casa do Largo da Igreja, n.º 17, Fundão.
                        Data:            Século XVIII – fins?


       
           A meio da fachada de um prédio de habitação com três pisos, fronteiro à igreja Matriz do Fundão, existe a mais enigmática e aparentemente indecifrável pedra de armas desta cidade.
       O prédio encontra-se hoje muito descaracterizado, principalmente a nível do rés-do-chão, e o posicionamento da pedra de armas não parece o mais adequado pela sua localização assimétrica e conflituante em relação à moldura de um óculo quadrilobado que lhe fica ao lado direito.
      Esta ingénua representação heráldica, de cariz popular quanto à sua factura, denota um incipiente canteiro que executa uma encomenda feita por alguém pouco exigente e conhecedor das regras da armaria.
        A sua forma grosseira e quase ininteligível de representar as armas do seu detentor foge a todos as mais elementares normas da heráldica, mas, apesar disso, e aceitando este desafio alicerçados no conhecimento das antigas famílias que alcançaram alguma notoriedade no concelho do Fundão, tornou-se possível a sua leitura.

Fundão, Casa Nogueira de Andrade.
      Este brasão aparentemente sem escudo, sem quartéis, sem elmo nem timbre, acaba por ter todos estes elementos iconograficamente visíveis, não como mandam as convenções heráldicas, mas por formas de representação caprichosas e aparentemente desprovidas de significado.
       Numa representação desta natureza, sem o conhecimento do alvará de concessão das armas, não se pode ter certezas absolutas sobre os apelidos representadas no seu esquartelado. Não é o caso deste brasão, o qual é possível interpretar cabalmente, assim como os seus diversos elementos constitutivos e as peças heráldicas que ostenta.
       Pela sua dificuldade interpretativa, derivada do seu atabalhoado formalismo, acabou por ser o mais fascinante desafio que deparamos no concelho do Fundão.

BRASÃO
          Esta inábil pedra de armas, feita pelo seu autor à revelia dos preceitos da heráldica, acaba por ser de grande valia quanto à informação que nos fornece.
         Aparentemente, ao artista canteiro só foi fornecida a descrição textual do brasão numa linguagem que lhe era desconhecida e complexa, a qual ele interpretou a seu modo, sem a visualização iconográfica do mesmo. O autor da encomenda não se opôs ao trabalho que lhe foi apresentado, e daí resultou este equívoco heráldico a requerer uma aturada descodificação.

       Observemos agora o citado brasão com maior detalhe.
      O canteiro que o fez, totalmente inexperiente na execução de pedras de armas, terá lido a sua descrição da qual constava um escudo dividido em quatro partes – esquartelado – e começou por afeiçoar uma pedra com essa forma. Nela colocou algumas nervuras salientes que se cruzam na perpendicular para apartar os campos do esquartelado, nos quais inseriu as diversas peças heráldicas que representavam os quatro costados do armigerado, carregados de bandas, costas, cabeças de serpente, e outros elementos da armaria cuja descrição textual se lhe afiguraria confusa.

          Vejamos então como seria o esquartelado representado com correcção: o 1.º de FEIO (de azul, com três bandas de vermelho, perfiladas de ouro); o 2.º de COSTA (de vermelho com seis costas de prata, postas 2, 2 e 2); o 3.º de ANDRADE (de verde, com banda de vermelho perfilada de ouro, e esta abocada por duas cabeças de serpente da mesma cor, armadas de vermelho); o 4.º de HOMEM (de azul, com seis crescentes de ouro 2, 2 e 2).
          A encimar este escudo temos um traço horizontal saliente, à laia de virol, no qual assenta uma espécie de elmo, envolto pelo respectivo timbre: um ramo de feijoeiro florido que compete às armas dos Feios. Tudo isto ladeado de duas bordaduras laterais, geometrizadas, representando o paquife.
          As famílias aqui representadas não são desconhecidas, pois tiveram alguma relevância no Fundão de outros tempos. Estes apelidos ainda se encontram em inúmeras pessoas residentes nesta região.

DADOS GENEALÓGICOS
          Identificados os quatro apelidos representados nesta pedra de armas, seria desejável a sua atribuição a uma qualquer antiga personalidade desta terra, porém tal não se concretizou em termos documentais. Embora as dificuldades sejam grandes, passemos à análise das famílias mencionadas nos respectivos quartéis.

Os FEIOS (1.º quartel), são conhecidos na Covilhã e no concelho do Fundão há mais de cinco séculos.
Alguns deles destacaram-se pelos seus cargos e fortuna, senão vejamos:
FERNÃO FEIO e sua mulher Maria Calvo, que fundaram “as igrejas de Santa Maria de Peraboa e de São Silvestre da Covilhã”, ainda no século XV. Estavam ligados aos Macedos da Covilhã, os quais posteriormente vieram viver para o Fundão num solar armoriado sito à Rua da Cale.
PEDRO FEIO, um filho dos anteriores, alcaide-mor de Sortelha, casado com Catarina Costa.
JOÃO FEIO (c. 1480), filho dos anteriores, escudeiro-fidalgo da Casa Real e juiz da Covilhã, onde casou com Isabel Vaz.
ANDRÉ FEIO DE CASTELO BRANCO, “Fidalgo e Prior de São Silvestre da Covilhã”, o qual é quarto neto de Martim Vaz de Castelo Branco, alcaide-mor da Covilhã, que obteve Carta de Brasão de Armas passada a 9-VIII-1580 .

Por sua vez, os COSTAS (2.º quartel), entroncam por via colateral no célebre D. Jorge da Costa (1406-1501), o “Cardeal de Alpedrinha”, que teve seis irmãos dos quais há um número infindável de descendentes que perpetuaram o apelido nesta região. Muitos deles aliaram-se matrimonialmente aos Feios e aos Freires, e hipoteticamente será a um descendente de uma destas ligações que poderá ser atribuída esta pedra de armas.

Quanto à família ANDRADE (3.º quartel), do ramo Andrade Freire, com vários ramos e algumas variações na representação do seu brasão de armas, é uma das antigas famílias desta cidade. Ligou-se por alianças matrimoniais aos Freires, dos quais usam as armas e o apelido associado ao seu, pela ordem de Andrade Freire, Freire de Andrade, ou cada um deles isoladamente, com pequenas variações heráldicas, conforme os ramos familiares. Alguns usavam duas caldeiras nas suas armas, mas os descendentes de Nuno Freire, omitiam-nas na sua representação heráldica, o que parece ser o caso deste brasão fundanense.

A Família HOMEM (4.º quartel), provém de Pedro Homem que viveu no reinado de D. Afonso III (1248-1279), e foi senhor da Lageosa e de Alfaiates, assim como de outros lugares da Beira. A sua descendência uniu-se aos Costas e aos Britos que tiveram representantes no Fundão desde tempos recuados.


Segundo sabemos, os FEIO da COSTA – dos dois primeiros quartéis do brasão – que representam os avós paternos do armigerado, andam há muito tempo unidos neste concelho numa das suas mais notáveis famílias. A estes juntou-se o apelido Andrade, dos Andrades Freire.

O casal que uniu estes dois apelidos foi:
1.  LOPO ÁLVARES FEIO, fidalgo castelhano, senhor de Atalaia do Campo, casado com D. MARGARIDA VAZ
    DA COSTA (f. 1550), irmã do Cardeal de Alpedrinha, que está sepultada na capela de Santa Catarina em
    Alpedrinha, com epitáfio datado de 1550.
    Tiveram onze filhos:
    2.  D. PEDRO FEIO DA COSTA (f. 1563), bispo do Porto, bispo de Leão e de Osna.
    2.  D. DIOGO FEIO DA COSTA (f. 1507), bispo do Porto (1505-1507).
    2.  JORGE FEIO DA COSTA, deão e tesoureiro da Sé de Braga.
    2.  CRISTÓVÃO FEIO DA COSTA (f. 1562), tesoureiro-mor da Sé de Lisboa, foi o primeiro administrador da
        Capela de Santa Catarina, em Alpedrinha, em cumprindo do testamento de seu tio D. Martinho da Costa,
        arcebispo de Lisboa e irmão do Cardeal de Alpedrinha. Foi sepultado na Capela de Santa Catarina, com
        epitáfio datado de 1562.
   2.  GASPAR FEIO DA COSTA, deão da Sé do Porto.
   2.  JOÃO FEIO DA COSTA, casado com D. INÊS DE NORONHA, da qual teve uma filha que faleceu sem gera-
        ção.
   2.  D. MARIA DA COSTA, casada com TOMÉ DE SOUSA (f. 1579) que foi fidalgo da Casa Real por Carta de
        7-VII-1537, e primeiro governador-geral do Brasil (1549-1553). Foi sua filha herdeira D. Helena da Costa
        a qual casou com Diogo Lopes de Lima. Falecida sem geração.
    2.  D. APOLÓNIA DA COSTA, casada com ANTÓNIO GIL FREIRE, senhor de Aldeia Nova das Donas.
        Tiveram numerosa geração, cujos descendentes foram senhores dos ricos morgados de Pancas e Ata-
        laia, assim como condes de Alpedrinha.
    2.  D. CATARINA DA COSTA, casada com JOÃO GARCIA.
    2.  D. HELENA DA COSTA, casada com PEDRO VAZ DA CUNHA. Sem geração.
    2.  D. JOANA DA COSTA, casada com FRANCISCO MACHADO FREIRE que foi alcaide-mor de Penha Garcia
         (n. 1500), filho de Luís Machado (n. 1470), senhor de Sandomil e Loriga, e de sua mulher Leonor Freire
         de Andrade (n. 1480). Tiveram geração que seguiu os apelidos Costa Freire.


Quanto aos apelidos ANDRADE e HOMEM, transmitidos ao armigerado pelos avós maternos como indicia a sua posição no esquartelado, as surpresas são muitas.

Ao fazer a verificação da genealogia desta família, deparamo-nos com gente notável, não só na Beira, como também na governação do país.
Estes Nogueira de Andrade, do Fundão, cujos antepassados são conhecidos, descendem dos morgados da capela de São Lourenço em Lisboa instituído em 1296. Entre os cargos notáveis dos seus maiores, contam-se vários bispos e arcebispos, assim como alcaides de Lisboa.

Fundão, Quinta da Nora
Desta família ficaram conhecidos no Fundão: PAULO NOGUEIRA DE ANDRADE (f. 1663), e seu filho AMARO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1672), este último casado com D. JOSEFA DE BRITO, da qual teve um filho homónimo que foi AMARO NOGUEIRA DE ANDRADE (n. 1679); assim como ANA DA COSTA e sua irmã D. BRITES FEIO DE ANDRADE, as quais, por escritura de 1694 instituíram a capela de Nossa Senhora da Piedade, com obrigação de uma missa cantada e respectivo sermão a 25 de Março de cada ano, dia de Nossa Senhora da Anunciação. A esta capela, situada na Quinta da Nora, vincularam a mesma quinta e outras propriedades, e nomearam para primeiro administrador o seu filho e sobrinho Amaro Nogueira de Andrade (c. 1672).

A Santa da sua maior devoção – Nossa Senhora da Anunciação (?) – encontra-se actualmente numa quinta particular em Viseu, cuja família proprietária foi a última que teve na sua posse a Quinta da Nora, que lhe foi expropriada no terceiro quartel do século XX.
A citada capela, muito antes desta expropriação, na sequência da revolução do 25 de Abril de 1974 já se encontrava arruinada e convertida em palheiro.

A última proprietária conhecida, talvez por compra dos seus antepassados, foi D. Maria da Luz Pimentel Osório de Vilhena (1855-1939), natural de Pêro Viseu, Fundão, casada com seu primo Francisco Afra de Sousa Vasconcelos (n. 1863), o último senhor da CASA DOS AFRA VASCONCELOS VILAS-BOAS em Vale de Prazeres. Esta senhora, juntamente com seus cinco filhos.
A capela ou ermida, como também aparece mencionada, e a respectiva quinta, hoje desaparecidas, ficavam junto à Rua Conde de Idanha-a-Nova e sucumbiram à pressão da recente expansão urbanística.
 
Nossa Senhora da Assunção, da Capela
da Quinta da Nora (desaparecida).

A Santa da sua devoção – Nossa Senhora da Anunciação (?) – encontra-se actualmente numa quinta particular em Viseu, cuja família tinha na sua posse a Quinta da Nora que lhes foi expropriada no terceiro quartel do século XX. A citada capela, muito antes da expropriação já se encontrava arruinada e convertida em palheiro.

A maior parte destas capelas – vínculos – foram instituídas com o fim de perpetuarem o apelido e as armas de uma família ilustre ou o nome dos fundadores, quase sempre sepultados em panteões ou capelas familiares à sua custa edificadas, com vários encargos piedosos pelas almas dos antepassados suportados por bens que lhe eram vinculados e constituíam um conjunto patrimonial inalienável, administrado por um usufrutuário que, regra geral, era o varão primogénito. Uma capela distingue-se de um morgado devido à finalidade das funções definidas à data da sua fundação. Temos um morgado quando a maior parte do rendimento dos bens vinculados é destinado ao herdeiro, sendo a parte destinada a obrigações piedosas de um montante muito mais pequeno. Temos uma capela quando os encargos com as obras piedosas absorvem a maior parte do rendimento dos mesmos bens. A administração do marquês de Pombal cria legislação que em 1770 suprimiu os morgados e capelas de pequeno rendimento, regulando-lhes a sucessão e não consentindo que se instituíssem senão morgados opulentíssimos, os quais por sua vez foram definitivamente extintos em 1863, com a excepção da casa de Bragança. Até 1777 serão abolidos cerca de 15.000 vínculos considerados insignificantes. Terá sido nesta altura que se extingue a capela (vínculo) de Nossa Senhora da Piedade, passando os bens vinculados a repartir-se pelos inúmeros herdeiros. Provavelmente esta capela, sem os rendimentos destes bens que incluíam a Quinta da Nora e outros terrenos, entrou em declínio e foi-se arruinando, como sucedeu a muitas outras.

Nada nos diz que a pedra de armas em apreço não tenha estado em tempos na capela Nossa Senhora da Piedade, tendo, por motivo de sua ruína, transitado para a fachada de uma das moradas desta família.


Ligação dos Nogueiras aos Freire de Andrade do Fundão

Vejamos a sucessão genealógica desta família:

1.  FERNÃO ANES NOGUEIRA, filho de João Anes Nogueira, neto paterno de Afonso Anes Nogueira (c. 1489)
    que vivia na então vila de Formoselha, no concelho de Montemor-o-Velho. Casou com D. LEONOR PIRES
    CEIÇA, filha de Fernão Pires de Ceiça, da nobreza da citada vila de Formoselha.
    Tiveram:
    2.  MANUEL FERNANDES NOGUEIRA, que segue.

2.  MANUEL FERNANDES NOGUEIRA, capitão de ordenanças, casado em segundas núpcias com D. ANA
    RODRIGUES DE OLIVEIRA, filha de João Rodrigues, e de sua mulher D. Brites Anes.
    Tiveram:
    3.  PAULO NOGUEIRA DE OLIVEIRA, que segue.
    3.  D. ANA NOGUEIRA que casou duas vezes. As primeiras núpcias foram com SALVADOR DE TÁVORA,
        juiz de fora de Lafões e da Covilhã. As segundas núpcias foram com GABRIEL DE FIGUEIREDO DE
        ANDRADE ARNAULT, do qual teve geração.
    3.  D. ISABEL DA CRUZ NOGUEIRA, casada com FRANCISCO DIAS GALVÃO, cavaleiro da Ordem de Cristo,
        do qual teve geração que seguiu os apelidos Galvão e Cota Falcão.
    3.  MANUEL DA CRUZ NOGUEIRA, padre jesuíta, confessor do rei D. Pedro II (1687-1706).

3.  PAULO NOGUEIRA DE OLIVEIRA (f. 1663), cavaleiro da Ordem de Cristo, prestou serviço durante vinte e
    três anos na Guerra da Restauração na qual atingiu o posto de capitão de Infantaria. Serviu em três arma-
    das e nas fronteiras do reino, até que morreu gloriosamente na Batalha de Ameixial a 8-VI-1663.
    Casou com D. BRITES FEIO DE ANDRADE (c. 1698), natural do Fundão a aí detentora de vários bens, a
    qual ainda vivia em 1694, ano em que instituiu juntamente com sua irmã ANA DA COSTA a capela de Nsª.
    Srª. da Piedade no Fundão.
    Sua mulher era filha de Amaro de Andrade Leitão casado com D. Ana da Costa; neta paterna de Francisco
     Leitão de Andrade e de D. Maria Colaça; neta materna de Pedro Carneiro e de Brites Feio da Costa, da qual
     desconhecemos a ascendência, mas temos a presunção de ter origem nos Feios da Costa, senhores da
     Atalaia, parentes do Cardeal de Alpedrinha.
    Tiveram:
4.  AMARO NOGUEIRA DE ANDRADE, que segue.

4.  AMARO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1672), cavaleiro da Ordem de Cristo, obteve a mercê de fidalgo da
    Casa Real por serviços prestados na armada que em 1672 saiu a correr a costa, e pelos feitos de seu pai.
    Era escrivão do Registo Geral das Mercês com o título de Secretário a 18-X-1690, e por Carta de Padrão de
    22-X-1698 obteve uma tença de 20$000 réis. Foi o primeiro administrador da capela de Nsa. Sra. da Piedade
    no Fundão. Casou com D. JOSEFA DE BRITO, filha de António Marques de Brito, cavaleiro da Ordem de
    Cristo, e de sua mulher D. Isabel de Brito.
    Tiveram:
    5.  PAULO NOGUEIRA DE ANDRADE, filho mais velho, que segue.
    5.  D. MARIA JOSEFA DE ANDRADE.
    5.  FRANCISCO ANDRADE, que serviu na Índia.

5.  PAULO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1688), homónimo do seu avô, foi fidalgo cavaleiro da Casa Real com
    1$600 réis de moradia por mês atribuídos por Alvará de 21-VI-1688, assim como obteve a tença de 20$000
    réis por Carta de Padrão datada 15-III-1694, e ainda a nomeação para escrivão do Registo de Mercês por
    Carta de 18-VIII-1755.
    Fez vários emprazamentos e por diversas provisões régias obteve a posse de terras na lezíria junto a
     Azambuja, nomeadamente o prazo da Quinta das Corredouras e as Terras do Diabo (1741, 1742). Por Carta
    de D. João V datada de 1744 obteve a renovação de vários emprazamentos e a confirmação de privilégios
    que vinham de seu pai. Nesta data era procurador da fazenda real e desembargador do Paço José Vaz de
    Carvalho (1673-1752) que promoveu a elevação do Fundão a vila em 1747. À ascensão e ao aumento do
    património de Paulo Nogueira de Andrade, certamente não foi estranha a amizade deste desembargador
    cuja família também era originária do Fundão onde tinha uma grande casa.
    Casou com D. MARIA TERESA DE MATOS LEITÃO, filha de Nicolau de Matos, juiz de fora de Évora, cavalei-
     ro da ordem de Cristo e familiar do Santo Ofício, e de sua mulher D. Antónia de Sequeira da Fonseca.
    Tiveram:
   6.  FRANCISCO DE PAULA NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1731), filho herdeiro dos vínculos, obteve várias
        tenças entre as quais uma de 12$000 réis e o hábito de Cristo por Portaria de 22-II-1731.
        Foi senhor de diversas comendas e morgados, entre as quais a comenda de São Salvador de Ourique.
        Obteve o privilégio de desembargador por Carta de 15-XI-1756, ao qual juntou o ofício de escrivão do
         Regimento das Mercês e 1.000$000 réis de ordenado por Alvará de 30-V-1766. Sem mais notícia.
    6.  NICOLAU DE MATOS LEITÃO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1720), monsenhor na Igreja Patriarcal, que
        segue abaixo.
    6.  D. ANTÓNIA, moça do coro da igreja de Santos.
    6.  D. JOSEFA, moça do coro da igreja de Santos.

6.  NICOLAU DE MATOS LEITÃO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1720), fidalgo da Casa Real por Alvará de
    13-XI-1720, da qual foi também fidalgo capelão por Alvará de 28-II-1751, monsenhor da Igreja Patriarcal,
    governador do Arcebispado de Évora, e do Conselho do rei D. José em cujo reinado faleceu como preso
    de Estado.
    Em 1769 deu início a uma acção judicial contra a Misericórdia de Lisboa reivindicando a posse de vários
    morgados, entre eles a comenda de São Salvador de Ourique, deixados por seu irmão Francisco Paula
    Nogueira de Andrade por não ter tido herdeiros como se presume. Desconhecemos o desfecho desta
    demanda.
    De D. ANA JOAQUINA TERESA DE SAMPAIO, filha de Sebastião Maior, capitão de Cavalaria, e de sua
    mulher D. Luísa de Sampaio, teve uma filha natural e legitimada a 11-XII-1769, que foi:
    7.  D. INÁCIA MARGARIDA UMBELINA DE BRITO NOGUEIRA E MATOS (1749-1808), que segue.

7.  D. INÁCIA MARGARIDA UMBELINA DE BRITO NOGUEIRA E MATOS (1749-1808), nascida em 1749, veio a
Diogo Inácio de Pina
Manique (1749-1808).
     falecer a 10-X-1808. Casou a 8-XII-1773 com o notável desembargador
     DIOGO INÁCIO DE PINA MANIQUE (1733-1805), 1.º senhor de Manique
     do Intendente, padroeiro da igreja de Santos, desembargador do Paço, 
     fidalgo da Casa Real e intendente geral da Polícia, da Corte e do Reino.
     Tiveram:
     8.  PEDRO ANTÓNIO DE PINA MANIQUE BRITO NOGUEIRA DE MATOS
          E ANDRADE (n. 1773)1.º Visconde de Manique do Intendente, que
          segue.
     8.  HELENA ANTÓNIA DE PINA MANIQUE (n. 1775), a qual nasceu a
          26-XII-1775. Casou a 14-II-1817 com JOSÉ JOAQUIM MARIA DE
         SOUSA TAVARES (n. 1776), nascido a 5-II-1776, falecido a ?-V-1837
         em Paris, que foi governador da praça de Abrantes e brigadeiro do
         Exército.
     8.  CATARINA ANTÓNIA DE PINA MANIQUE (n. 1779), a qual nasceu a
         12-II-1779. Casou a 27-VIII-1814 com HENRIQUE PINTO DE MESQUITA
         DE MORAIS SARMENTO GUEDES, senhor do morgado da Cumieira,
         coronel do Exército.
         Tiveram geração.
    8.  PAULO DE PINA MANIQUE (n. 1781), nascido a 26-II-1781, o qual foi
         coronel de milícias. Sem mais notícia.

8.  PEDRO ANTÓNIO DE PINA MANIQUE BRITO NOGUEIRA DE MATOS E ANDRADE (n. 1773)1.º Barão e 1.º
    Visconde de Manique do Intendente (1801). Moço fidalgo por Alvará de 13-X-1784, senhor de Manique do
    Intendente, 5.º senhor do morgado de São Joaquim da vila de Coina, alcaide-mor de Portalegre, comenda-
    dor da Ordem de Cristo, deputado da Mesa da Consciência e Ordens, conselheiro do Ultramar, e desembar-
    gador da Relação do Porto por Carta de 15-VII-1769.
    Nasceu a 20-IX-1733 e faleceu a 5-II-1839 no Palácio do Intendente em Lisboa.
    Casou a 28-VII-1806 com D. MARIA DA GLÓRIA DA CUNHA E MENEZES (1787-1858), nascida a 5-III-1801
    em São Paulo, no Brasil, filha natural legitimada em 1801 de D. Francisco da Cunha e Menezes (1747-1812),
    capitão general de S. Paulo e um dos governadores do Rio de Janeiro em 1807, assim como governador da
    Índia. Tiveram geração conhecida que continuou os apelidos Pina Manique.


Atribuição presumível a
PAULO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1688)

Do que vai exposto podemos inferir que esta irregular pedra de armas, por falta de documentação que a confirme e até prova em contrário, será atribuível a um dos muitos ilustres descendentes de Lopo Álvares Feio, senhor da Atalaia do Campo, casado com Margarida Vaz da Costa (f. 1550), irmã do Cardeal de Alpedrinha.
Com grande probabilidade estas armas pertenceram a PAULO NOGUEIRA DE ANDRADE (c. 1688), homónimo de seu avô, pois o esquartelado do brasão corresponde aos apelidos dos seus avós paternos e maternos.
Este fidalgo da Casa Real terá herdado algum património não desprezível que à sua custa aumentou em Azambuja e era suficiente para viver à "lei da nobreza".
Sabemos que teve: um filho varão primogénito que não deixou descendência; outro que foi monsenhor na Igreja Patriarcal, o qual por sua vez teve uma filha natural e legitimada em 1769; assim como, pelo menos, mais duas irmãs que parece não terem tido descendentes, pois foi o filho padre que entrou em litígio com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa à qual disputou os vínculos que seu irmão terá deixado em testamento a essa instituição benemérita por falta de filhos sucessores.
Quanto aos bens do Fundão, ou foram alienados por esta altura (1769), ou passaram a algum parente colateral que desconhecemos.
Desconhecida também é, por falta de documentação, a existência de um processo de Justificação de Nobreza para se habilitar às armas dos seus avós. Muitos fidalgos com várias gerações ao serviço da Corte e antepassados proeminentes na guerra ou na governação do país, dispensavam-se das ditas justificações, pelo que assumiam as armas e compunham os seus brasões baseados nos que outrora foram conferidos aos seus antepassados, à revelia da Lei . Tudo isto sem grande polémica, especialmente em terras distantes da Corte.
Talvez seja o caso de Paulo Nogueira de Andrade, (c. 1688), que se fixou em Lisboa e engrandeceu o seu património familiar com várias terras adquiridas na Azambuja, mas quis perpetuar a memória dos seus ancestrais nesta singela pedra de armas, com a qual armoriou a fachada de uma sua casa no Fundão.
Este gesto de afirmação da sua nobreza permitiu-nos, mais de três séculos depois, resgatar a memória desta ilustre e antiga família do passado Fundanense.
Foi com imensa satisfação que o fizemos.

Manique do Intendente, Palácio Pina Manique
(inacabado).



Lisboa, Largo do Intendente,
Casa do Intendente Pina Manique.













Manique do Intendente, Casa da Câmara
(edificada por Pina Manique).




Publicado na Revista EBVROBRIGA, n.º 5, 2008.
Museu Arqueológico Municipal José Monteiro
Rua do Serrão, Nº 13-15, 6230-418 Fundão - PORTUGAL



2010-04-08

Casa do Serrão (Séc. XVII) - Fundão


Gonçalo Serrão de Azevedo (1590?-1662), 1641.
  

                           Brasão de:   Gonçalo Serrão de Azevedo (1590?-1662)
                           Forma:         Escudo português inclinado para a dextra e cortado. O chefe do
                                                cortado terciado em pala: o 1.º de SERRÃO – um leão sobre um
                                                monte; o 2.º e o 3.º, em conjunto, de AZEVEDO (simplificado) – o
                                                primeiro com uma águia estendida, e o segundo com cinco estrelas
                                                de seis pontas e bordadura carregada com oito aspas.
                                                O contrachefe de ROCHA – uma aspa carregada de cinco vieiras.
                           Elmo:           De grades voltado a três quartos de perfil, olhando à direita do 
                                                escudo.
                           Timbre:        Um leão sainte, tirado das armas da família Serrão.
                           Local:          Fachada de casa na Rua da Cale, Fundão.
                           Data:           1641



Casa do Serrão, Rua da Cale,
 Fundão.
     A meio da emblemática Rua da Cale, uma das antigas artérias do burgo, no lado esquerdo de quem sobe, situa-se uma casa armoriada cujo brasão durante vários séculos resistiu a todas a tentativas de identificação do seu legítimo detentor. A leitura das peças heráldicas indiciadoras dos respectivos apelidos que aí figuram não nos levantava problemas.   
   A questão que se levantava, era a sua atribuição a qualquer personagem conhecida na história local. As famílias nele representadas aparentemente não pertenciam ao número daquelas que, desde há longos séculos, são referenciadas nesta região. Para dificultar a pesquisa havia algumas interpretações já publicadas que davam esta casa como tendo pertencido à família do padre António Vieira, atribuições estas alicerçada num erro de interpretação heráldica, induzido pelo facto de uma das partições do escudo ostentar cinco vieiras.


Brasão
      Esta pedra de armas, trabalho de cantaria de fino recorte a denotar a mão hábil de um artista sensível, apresenta uma composição quase irrepreensível segundo as mais estritas regras da Armaria, com todos os seus elementos entre os quais sobressai um bem desenhado paquife de folhas de acanto que se desenvolve com grande sentido estético e ocupa toda a forma rectangular onde se inscreve. Devido à sua apreciável dimensão é formado pela junção de dois blocos de granito que se unem a meio da metade superior, sem prejuízo para a estética do seu conjunto, estando emoldurado por um bem desenhado rebordo exterior saliente.
     Para sabermos a quem pertenceu esta imponente representação escudo de armas, temos que fazer a leitura detalhada das suas diversas peças heráldicas, sem perder de vista o seu conjunto.
     O escudo do brasão, quanto à sua partição é cortado. A primeira metade superior está terciada em pala: o 1.º de SERRÃO (leão sobre um monte); o 2.º e 3.º, em conjunto, de AZEVEDO (o primeiro com uma águia estendida, o segundo com cinco estrelas de seis pontas e bordadura carregada de oito aspas). A parte inferior representa a família ROCHA (aspa carregada de cinco vieiras). A encimar o escudo temos o elmo, aberto e voltado para a direita, posto a três quartos, o que indica ser de um nobre de mais de três gerações. Por cima deste figura o virol, sobre o qual assenta como timbre um leão sainte que representa a família SERRÃO.
     As armas da família Azevedo, aqui representadas e vindas por via de uma avó materna, são derivadas das armas da família Azevedo Coutinho, senhores da casa de São João de Rei.
Esta pedra de armas, de rara qualidade estética, só tem paralelo no concelho do Fundão, tanto na sua tipologia como na data da concessão, numa outra existente na casa dos morgados de São Nicolau em Alcongosta. Sabemos que teve carta de brasão de armas em Abril de 1641, desconhecendo-se o alvará da sua concessão .

Gonçalo Serrão de Azevedo
     O seu detentor foi GONÇALO SERRÃO DE AZEVEDO (1590?-1662), natural de Lisboa, o qual veio residir no Fundão . É ele o primeiro Serrão a ser mencionado na história desta terra, e sabemos ter nascido por volta de 1590 em Lisboa, ao que parece na freguesia das Mercês como consta no seu registo de casamento. Falecido a 28-V-1662 no Fundão, com testamento, foi sepultado na igreja matriz.
      Fixou-se nesta terra ao serviço da administração Filipina no desempenho do ofício de «escrivão das sisas gerais, guias e selos dos panos do Fundão», cargo para o qual foi nomeado por carta régia de 15-II-1622, em substituição do anterior titular Manuel Carvalho, entretanto falecido. Exerceu este ofício até ao final dos seus dias, durante quarenta anos.
Por altura da concessão das armas já citadas (1641), recebeu ainda a mercê de escudeiro fidalgo com 750 réis de moradia por mês, tendo passado a cavaleiro fidalgo em retribuição dos serviços prestados por seu pai .
       Em 1656, em busca de maior prestígio social ou melhores condições económicas, habilitou-se para o cargo de familiar do Santo Ofício, porém sem sucesso. Apesar das boas informações obtidas no início do processo de habilitação, acabou por lhe ser recusado o cargo devido ao parecer negativo de algumas das seis testemunhas inquiridas no Fundão. Estas, talvez por despeito ou devido a algum ajuste de contas provocado pelo seu ofício de escrivão de sisas, foram contraditórias nos seus testemunhos e alegaram «que não era de boa vida e costumes» e «estava infamado de cristão novo», sendo «incapaz de guardar segredo»; enquanto outras reconheciam que vivia «com limpeza», que «se tratava bem», e era pessoa de «juízo» .
       Era filho legítimo de Manuel Serrão de Azevedo, moço da câmara de Sua Majestade, escrivão da Mesa da Câmara do Desembargo do Paço, natural de Moura, e de sua mulher D. Branca Rodrigues de Azevedo, natural da freguesia dos Mártires em Lisboa, onde residiu na Rua da Barroca, e dos quais há testemunho de terem morado na Covilhã na década de 1620, donde muitas vezes vieram ao Fundão, e onde seu filho ocuparia um cargo.
     Era neto paterno de Francisco Serrão, moço da câmara de Sua Majestade, executor das contas do Reino, e de sua mulher D. Joana Lopes da Rocha, da vila de Serpa; e neto materno de Brás Fernandes de Azevedo que teve foro e moradia da Casa Real, e de sua mulher D. Isabel Manoel, moradores na Rua da Barroca, ao Bairro Alto, em Lisboa.
Seus pais e avós, originários de Lisboa, de Moura e de Serpa, eram gente nobre de longa data com foro da Casa Real, na qual serviam.
     Casou duas vezes e teve pelo menos 14 filhos, dos quais nem todos sobreviveram por muito tempo. Esta numerosa prole indiciava alguma capacidade financeira do patriarca desta família, o que certamente não o livraria de algumas dificuldades para sustentar tantos filhos. O ordenado anual de mil réis que lhe competia no exercício do cargo que desempenhava, ao qual juntaria alguns outros emolumentos ou tenças, não sendo de pequena monta, seria certamente insuficiente face à instabilidade e dificuldades económicas sentidas nos últimos tempos da monarquia filipina, assim como da guerra resultante da subsequente restauração da coroa portuguesa.
      As sua primeiras núpcias foram celebradas na igreja matriz do Fundão a 16-XII-1624 com D. ANTÓNIA RODRIGUES (f. 1635), filha de António Dias e de Antónia Rodrigues, todos daqui naturais, provavelmente moradores na rua que mais tarde passou a designar-se por rua do Serrão, por este aí ter residido após o seu casamento, em casa próxima dos seus sogros, que eram cristãos-velhos e tinham decerto alguma capacidade económica. Sua mulher faleceu a 27-XI-1635, doze dias depois do último parto de seu filho João, que não terá sobrevivido por muito tempo, tendo sido sepultada dentro da igreja paroquial do Fundão.
      Falecida sua primeira mulher, Gonçalo Serrão de Azevedo passou a segundas núpcias a 2-IX-1637 na Igreja de Nossa Senhora da Graça, em Castelo Novo, com D. JULIANA DA COSTA PINTO (f. 1679), natural da Guarda, falecida a 1-III-1679 no Fundão, com testamento e sepultada na igreja matriz; filha de Francisco da Costa Pinto (f. 1639), natural da Torre de Moncorvo, tabelião do público judicial e notas de Castelo Novo, terra onde veio a falecer a 28-VIII-1639, e na qual casou com sua mulher Apolónia Leitão (f. 1668), natural de Castelo Novo.

Do 1.º casamento com D. Antónia Rodrigues, conhecemos os seguintes filhos :
1.º - MANUEL (n. 1626), nasceu no Fundão a 29-XI-1626, tendo por padrinho de baptismo o abastado e proe-
       minente Heitor Pinto Cardoso e Filipa Rodrigues.
2.º - FRANCISCO RODRIGUES SERRÃO (1630-1692), nasceu a 23-III-1630 e foi baptizado a 7-IV-1730, tendo
       por padrinhos Teodósio Correia e sua mulher D. Brites Barbosa, da Covilhã. Este casou com D. Maria
       Nunes, da qual teve vários filhos que foram: ISABEL (b. a 9-VII-1657); MARIA (b. 29-VIII-1658); ANTÓNIO
       (b. a 24-XII-1659); D. ANTÓNIA RODRIGUES DE AZEVEDO, casada a 8-VII-1690 com Bento de Andrade;
       D. DOMINGAS SERROA DE AZEVEDO (b. 2-VIII-1665), casada em 1709 com Lucas da CunhaFaleceu a
        22-III-1692 e foi sepultado dentro da matriz do Fundão.
3.º - MIGUEL SERRÃO DE AZEVEDO (1633-1701), nasceu a 1-X-1633 e foi baptizado 8 dias depois, apadrinha-
      do por Heitor Pinto Cardoso e Brites da Rocha. Casou no Fundão com D. Ana Mendes, filha de D. Ana
      Rodrigues, viúva de Francisco Mendes Falcão. Faleceu a 5-II-1701 e foi sepultado na igreja da Misericór-
      dia.
4.º - JOÃO (n. 1635), nasceu a 15-XI-1635, baptizado a 23-XI-1635, tendo por padrinhos João Correia, juiz de
      fora da Covilhã, e Maria Rodrigues.

Do 2.º casamento com D. Juliana da Costa Pinto, teve numerosa prole:
5.º - MARIA AZEVEDO (n. 1638), nasceu a 15-VIII-1638, sendo apadrinhada pelo prior Dr. Gaspar Gomes Real
      e Ana da Costa Pinto, mulher de Francisco Dias Beirão. Casou em 1662 com André Botelho da Fonseca.
6.º - MANUEL (n. 1639), nasceu a 5-IX-1639, tendo por padrinhos o mesmo prior e Branca Nunes, mulher de
      Francisco Salvado. Terá falecido novo.
7.º - FRANCISCO DA COSTA PINTO (1641-1696), nasceu a 12-V-1641 e foi também apadrinhado pelo prior Dr.
      Gaspar Gomes Real. Terá falecido em 1696, ano em que foi reconhecido aos seus filhos a sucessão nos
      cargos e ofícios de seu pai. Fidalgo da Casa Real e capitão de cavalos com o soldo de 32$000 réis por
      sucessão de seu pai e carta de 10-X-1669, foi-lhe atribuído a propriedade do ofício de «escrivão das sisas
      gerais do Fundão e dos panos e selos deles e das guias do lugar do Fundão» por cedência de sua irmã
      Apolónia Leitoa. Em 25-V-1669 obteve uma tensa de 80$000 réis de pensão e o hábito da Ordem de Cristo.
      Foi assistente em cortes e procurador de Castelo de Vide (1674?) e da Bahia (1679-1680), recebendo o en-
      cargo de escrivão da câmara na Mesa do Desembargo do Paço.
      Casou duas vezes e teve geração de ambos os casamentos. Das segundas núpcias celebradas em Lisboa
      com D. Francisca Leonor de Bacelar Sotomayor (n. 1662), natural de Monção, teve dois filhos: 
     GONÇALO FRANCISCO DA COSTA SOTOMAYOR (n. 1686), nascido em Lisboa; e DUARTE CLÁUDIO HUET
     SOTOMAYOR (n. 1687), também nascido em Lisboa e herdeiro do ofício de escrivão de cisas. Destes pro-
     cedem os Huet Bacelar dos nossos dias.
8.º - GONÇALO DA ROCHA SERRÃO (n. 1662), nasceu a 18-XII-1642 e foi apadrinhado pelo mesmo prior e por
      sua tia Apolónia Leitoa, solteira, de Castelo Novo. Combateu na Guerra da Restauração e obteve a mercê
      de capitão da Companhia de Infantaria da Bhaia (16-IV-1676), no Brasil. Por carta padrão de 9-V-1681 teve
      uma tença de 12$000 réis e o hábito da Ordem de Cristo .
9.º - ANTÓNIO (n. 1644), nasceu a 1-I-1644 e foi apadrinhado pelo sobredito prior e por Maria Salvada, mulher
      de Manuel Homem.
10.º - D. APOLÓNIA LEITOA (n. 1646), baptizada a 14-III-1646. Obteve um dote de 200$000 réis e a mercê dos
      ofícios de seu pai que era «escrivão das sisas gerais do Fundão». Como não casou, passou este direito
      à posse do seu irmão Francisco da Costa Pinto, tendo ingressado como religiosa no convento de São Vi-
      cente da Beira.
11.º - JERÓNIMO DA COSTA PINTO (1647-1704), nasceu em perigo de vida a 28-III-1647 pelo que foi baptizado
      em casa pelo cura P.e José Alves, recebendo posteriormente a 12-V-1647 os santos óleos na matriz do
       Fundão. Prestou serviço na cavalaria e infantaria da província da Beirasendo posteriormente nomeado
       capitão da Companhia de Infantaria da Bahia no Brasil por uma provisão datada de 24-III-1684, terminan-
       do por servir na província do Alentejo, onde a morte o surpreendeu no quartel de Borba a 22-XI-1704 com
      perto de 29 anos de serviço activo e no posto de alferes de infantaria.
12.º - JOSÉ SERRÃO DE AZEVEDO (n. 1652), baptizado a 15-X-1652 na igreja matriz do Fundão, apadrinhado
       pelo seu tio materno António da Costa Pinto de Castelo Novo. A 17-III-1696 recebeu a mercê de «capitão
       de infantaria da gente que vai nesta monção de socorro para a Índia na Nau N.ª Senhora da Glória»;
       seguindo-se a 22-III-1696 o alvará de fidalgo cavaleiro da Casa Real com 1$600 réis de moradia por mês e
       um alqueire de cevada por dia, assim como uma carta padrão com ajuda de custo de 600$000 réis para a
       sua viagem para a Índia.
13.º - D. JULIANA (n. 1657), baptizada a 8-VII-1654 na matriz, apadrinhada pelo prior Pedro Mena Falcão.
14.º - D. MARTINHA (n. 1657), baptizada a 18-VII-1657.


Carta de Brasão de Armas de G. S. A.
«GONÇALO SERRÃO DE AZEVEDO, cavaleiro fidalgo, natural de Lisboa e morador no Fundão, termo da vila da Covilhã; filho de Manuel Serrão, moço de câmara de Sua Majestade, natural da vila de Moura; e neto de Francisco Serrão e de sua mulher Joana Lopes da Rocha, da vila de Serpa. O suplicante era filho legitimo de Branca Rodrigues de Azevedo, natural de Lisboa e filha de Brás Fernandes de Azevedo que teve foro e moradia da casa Real, e de sua mulher Isabel Manoel.Partido de três em chefe: SERRÕES, AZEVEDOS e ROCHAS. Diferença: uma flor-de-lis azul. Brasão passado a ... de Abril de 1641»


Obs:
Devemos às investigações do Professor Doutor Joaquim Candeias da Silva, que fez um exaustivo levantamento dos arquivos paroquiais e das chancelarias régias, muita da informação sobre os descendentes do biografado, o qual foi por nós dado a conhecer em primeira mão num artigo publicado no Jornal do Fundão no ano de 2002. Esse artigo de jornal é a base deste trabalho com recurso a posteriores investigações nossas e do citado investigador, que para nós tem sido um grande exemplo de amor pelo torrão natal, e ao qual expressamos aqui a nossa gratidão.

cfr. TRIGUEIROS, João, «A casa e o brasão de Gonçalo Serrão de Azevedo - Atribuição Inédita de um Brasão», Jornal do Fundão, Cultura, 2002-VIII-23, p. 42; e SILVA, Joaquim Candeias, «Subsídio para o enquadramento histórico da casa onde se encontra instalado o Museu Arqueológico José Monteiro», Revista Ebvrobriga, Fundão, Museu José Monteiro, n.º 5, 2008, pp. 53-68.